Sunday, August 08, 2010
Queijo D.O.C.
São Paulo, domingo, 08 de agosto de 2010, Folha de S. Paulo Ilustrissima
ENSAIO
Não mexam no meu queijo
O canastra resiste à industrialização
CARLOS ALBERTO DÓRIA
resumo
Recentemente tombado pelo Iphan como "patrimônio imaterial", o queijo minas feito com leite cru na Serra da Canastra (MG) é o símbolo de um modo de vida em vias de extinção. O potencial de valorização da produção artesanal de alimentos, no entanto, ainda esbarra em obstáculos legais, econômicos e culturais.
Uma pradaria eternamente lambida pela brisa silenciosa estende-se, monótona, por mais de 70 quilômetros, no alto da Serra da Canastra, onde nasce o rio São Francisco. Poucos vestígios de ocupação humana nesse lugar mítico, transformado em parque nacional pelo regime militar, em 1972. Ruínas dos cercados de pedra de um curral de bois de séculos atrás, estabelecido por conta da excelência da pastagem, chamam a atenção do viajante. Vez ou outra um tamanduá, um gavião ou um escorpião aparecem como provas ambulantes de um passado e uma natureza que teimam em permanecer. Ali é sertão das Gerais.
O parque, criado antes da onda ecológica para preservar as nascentes do rio da "integração nacional", ocupa o centro de uma vasta região pecuária que se derrama pelas encostas da serra, onde se produz aquele que é considerado o melhor queijo do Brasil: o "canastra". O canastra é a "nata" do queijo brasileiro. E a "nata" do canastra é o Canastra Real. Estima-se que a produção rural de queijos brasileiros envolva 359 mil produtores, que produzem 202 mil toneladas, sendo que 72 mil deles estão em Minas Gerais. Cerca de 88% são pequenos produtores, como o sr. José Mario, produzindo a partir de cerca de 50 litros de leite por dia.
Modo de Vida Como todo queijo de leite cru, o canastra nasce do artesanato agroalimentar e é a materialização de um modo de vida. Ele absorve, 365 dias por ano, o trabalho do proprietário e sua família. Sem o queijo, o leite é vendido a preço vil para os grandes laticínios, os filhos mudam para a cidade, a família se desestrutura. O queijo industrial deixa atrás de si a morte da pequena propriedade agropastoril.
"Não tenho precisão de nada além de açúcar e sal", diz José Mário, um dos artesãos mais respeitados de São Roque de Minas (MG). Esguio, vestido com apuro, envergando o seu inseparável chapéu, ele pontifica no terraço de sua casa: "Desde que me tenho por gente faço queijo, nunca fiz outra coisa e nem quis".
Mas há gente que pensa em desistir. O brasileiro come meio quilo de queijo minas por ano, sendo que no Sudeste (incluindo Minas Gerais) esse total sobe para 833 gramas. Mas esses dados do IBGE se referem a todo queijo de coalho, chamado "tipo minas". Os verdadeiros são aqueles de algumas poucas regiões do Estado de Minas Gerais, segundo iniciativa do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) que cuidou de "tombar", no ano passado, o modo de fazê-lo no Serro, Canastra e Araxá -todas regiões de Minas Gerais. E os produtores dessas poucas e pequenas regiões lutam pela demarcação da área e pela certificação pública da qualidade e procedência do produto. Ao leite, tirado da vaca, ainda quente, se acrescenta o coalho e o "pingo" -uma pequena porção do soro que restou do leite coalhado no dia anterior, rico em microorganismos que conferem a tipicidade do queijo de uma região ou produtor. É a herança da qualidade que se mantém através dos tempos e conserva sua identidade. Depois, a massa é prensada, colocada em formas cilíndricas e coberto com sal grosso. No dia seguinte, é desenformado e colocado em estantes de madeira para secar. Em duas ou três semanas está pronto, atingindo excelente maturação em 30 dias (meia-cura).
Insubordinação Mas o maior inimigo do queijo feito como o Iphan descreve é o próprio Estado. Por legislação sanitária de 1952 -que possui mais de 900 artigos!-, a queijaria, onde se faz o autêntico minas é definida como instituição transitória, pois elas "só podem funcionar quando filiadas a entrepostos de laticínios registrados, nos quais será complementado o preparo do produto com sua maturação, embalagem e rotulagem". Isso quer dizer que, quando houver nas proximidades uma usina de leite, em geral de propriedade de grandes indústrias ou cooperativas, a "queijaria" autônoma se torna um ato de insubordinação; a produção se torna ilegal.
Por isso, das 72 mil toneladas que se produzem em Minas, estima-se que cerca 60 mil são comercializadas no mercado informal. Sem o carimbo sanitário federal -o SIF- o queijo não pode ir além dos limites municipais, a menos que o governo do Estado assuma a inspeção e permita que circule em seu território, como em Minas Gerais desde o governo de Itamar Franco (1999-2002). As autoridades do SIF simplesmente ignoram as condições especiais e exigem que a queijaria tenha uma infraestrutura que está muito longe das posses dos pequenos pecuaristas, estabelecem prazos mínimos de maturação, formas de embalagem, meios de estocagem que descaracterizam completamente a tipicidade do canastra. Assim, a filosofia higienista das autoridades, seguindo o modelo norte-americano depois da Segunda Guerra, tem provocado estragos no mundo todo. Na França, onde a esmagadora maioria dos seus mais de 500 queijos é de leite cru, tem desenvolvido um duplo padrão: o queijo autêntico, de "terroir", fabricado apenas para o mercado interno; o queijo de leite pasteurizado, para exportação, especialmente para os EUA. É o proprietário da queijaria Marie Quatrehomme (62, Rue de Sèvres, Paris) quem nos diz: "A grande indústria de laticínios usa o Estado, as normas higiênicas, para se impor, monopolizar o negócio. O leite pasteurizado é interesse da grande indústria, não do pequeno produtor". Luciano Carvalho Machado, presidente de uma associação de produtores de queijos canastra em Medeiros (MG), produtor inclusive do Canastra Real, indaga, abismado, deste lado do Atlântico: "Se o cigarro, que faz tanto mal, pode ser comercializado legalmente com aquelas advertências, por que não colocam um selo no queijo de leite cru dizendo que possuem microorganismos que podem ser nocivos à saúde?". E acrescenta: "Eu fui criado com queijo, meus filhos comem queijo. Veja como são crianças sadias!". O Canastra Real é um filigrana dessa história.
Além de Luciano, em Medeiros, só João Leite, em São Roque de Minas, faz este tipo de queijo. Os dois mantêm a tradição de um produto feito desde o século 18 para presentear pessoas gradas: no passado, autoridades; hoje, banqueiros e "gourmands". Em cada grau de maturação (entre 30 e 240 dias), o queijo apresenta diferentes qualidades sensoriais: sabor, aroma, textura. A partir de uma produção, portanto, o tempo, a temperatura e umidade criam novos e variados queijos. Séculos são necessários para se criar um queijo típico e o Brasil é pobre em queijos originais. Mas, cronista e observador arguto, o naturalista Auguste Saint-Hilaire, que viajou pelas encostas da Serra da Canastra, já registrava esse queijo e seu alto conceito, inclusive na corte. Acondicionado em burracas, no lombo de burros, atravessavam pacificamente o sertão mineiro e desciam para o Rio de Janeiro em longas viagens ao largo das quais "amadurecia".
Exceção Em maio, o presidente Lula editou um decreto visando estimular os acordos entre municípios e Estados, com o objetivo de criar uma rede nacional de entidades fiscalizadoras que permitiriam a livre circulação dos produtos da agroindústria artesanal. A norma mostra que o governo federal sente que aí há um problema a resolver. Mas as entidades de produtores reivindicam mais do que isso; por exemplo, que o Ministério do Desenvolvimento Agrário assuma a tutela dos pequenos produtores. Um estatuto especial, uma norma de exceção, seria a saída para um produto que é, ele mesmo, uma exceção ameaçada de morte.
No mundo todo, após a globalização, os pequenos produtores rurais lutam -e muitos conseguem- o reconhecimento da particularidade de suas obras, gozando de proteção pública. Só assim são capazes de competir nos novos mercados sem serem massacrados pelo grande capital.
Azeites, vinhos, geleias, sal, queijos, deixaram de ser coisas uniformes para serem multifacetadas e apreciadas em suas qualidades diversas. Essa é a luta do queijo canastra -especialmente a do Canastra Real; uma luta ao mesmo tempo universal e local, para a qual os brasileiros precisam estar atentos.
Tuesday, August 03, 2010
Observaciones sobre el plano-secuencia: un ensayo de Pasolini
un ensayo de pasolini
Al revisar, hace unos días, el número 21 de El poeta y su trabajo (invierno de 2005), me encontré con este ensayo fascinante de Pasolini: “Observaciones sobre el plano secuencia“; observaciones, también, sobre las posibilidades de la vida y su incógnita y del montaje, como un modelo para armar, después de la muerte. Vale mucho la pena detenerse, en este mismo número, en el ensayo de Aldo Pellegrini, “La acción subversiva de la poesía“; en el poema “Cuevas“ de Robert Creeley y en “Versos de testamento“ del propio Pasolini.
Observaciones sobre el plano-secuencia
Pier Paolo Pasolini
Traducción: Javier Barreiro Cavestany
Observemos la filmación en 16 mm, realizada por un espectador en la muchedumbre, sobre la muerte de Kennedy. Se trata de un plano-secuencia, y es el más típico plano-secuencia posible.
El espectador-operador, en efecto, no decidió los ángulos visuales: simplemente filmó desde donde estaba, encuadrando lo que su ojo —más que el lente— veía.
El plano-secuencia típico es, por lo tanto, una “subjetiva”.
En la película posible sobre la muerte de Kennedy faltan todos los demás ángulos visuales: el de Kennedy mismo y el de Jacqueline, el del asesino que disparaba y el de los cómplices, el de las demás personas presentes ubicadas en los lugares más apropiados y el de los guardaespaldas, etcétera.
Suponiendo que tuviésemos pequeñas filmaciones realizadas desde todos esos ángulos visuales, ¿de qué dispondríamos? De una serie de planos-secuencia que reproducirían las cosas y las acciones reales de esa hora, vistos contemporáneamente desde distintos ángulos visuales: es decir, vistos a través de una serie de “subjetivas”. La subjetiva es entonces el límite de máximo realismo de toda técnica audiovisual. No es concebible “ver y sentir” la realidad mientras sucede si no es desde un solo ángulo visual: y este ángulo visual es siempre el de un sujeto que ve y que siente. Es un sujeto en carne y hueso, porque aunque nosotros, en una película de acción, elijamos un punto de vista ideal y, por lo tanto, de alguna manera abstracto y no naturalista, se vuelve realista y, en última instancia, naturalista, en el momento en que ponemos una cámara y un micrófono en ese punto de vista: resultará algo visto y oído por un sujeto en carne y hueso (es decir, con ojos y oídos).
Ahora bien, la realidad vista y oída en su acaecer es siempre en el tiempo presente.
El tiempo del plano-secuencia, entendido como elemento esquemático y primordial del cine —es decir, como subjetiva infinita— es entonces el presente. En consecuencia, el cine “reproduce el presente”. La “toma directa” de la televisión es una paradigmática reproducción del presente de algo que sucede.
Supongamos entonces que disponemos no sólo de una sola filmación sobre la muerte de Kennedy, sino de una docena de filmaciones análogas, como planos-secuencia que reproducen subjetivamente el presente de la muerte del presidente. En el momento mismo en que nosotros, aun por razones puramente documentales (supongamos en una sala de proyección del la policía que lleva a cabo la pesquisa), vemos uno tras otro todos estos planos-secuencia subjetivos, es decir, los añadimos unos a otros, aunque no materialmente, ¿qué hacemos? Hacemos una especie de montaje, aunque sea extremadamente elemental. ¿Y qué obtenemos con este montaje? Obtenemos una multiplicación de “presentes”, como si la acción en vez de llevarse a cabo una vez sola ante nuestros ojos, sucediese varias veces. Esta multiplicación de “presentes”, en realidad, comporta la abolición del presente, su anulación, al postular cada uno de esos presentes la relatividad del otro, su falta de credibilidad, su imprecisión, su ambigüedad.
Al observar, para una pesquisa policial —la menos interesada en cualquier hecho estético, y muy interesada, en cambio, en el valor documental de las filmaciones proyectadas como testimonios oculares de un hecho real que hay que reconstruir con exactitud—, la pregunta que nos haremos es la siguiente: ¿cuál de todas estas filmaciones representa con mayor aproximación la realidad precisa de los hechos? Hay tantos pobres ojos y oídos (o filmadoras y micrófonos) frente a los cuales pasó un capítulo irreversible de la realidad, presentándose a cada pareja de estos órganos naturales o de estos instrumentos técnicos, de manera distinta (campo, contracampo, total, plano americano, primer plano, y todos lo ángulos posibles): ahora bien, cada una de estas maneras en que se presentó la realidad es extremadamente pobre, aleatoria, casi digna de compasión, si pensamos que es una sola y que las demás son muchas, infinitamente muchas.
De todas formas, está claro que la realidad, con todas sus caras, se ha expresado: ha dicho algo a quien estaba presente (estaba presente, como parte de la misma: PORQUE LA REALIDAD NO HABLA MÁS QUE CONSIGO MISMA): ha dicho algo con su lenguaje, que es el lenguaje de la acción (integrado por los lenguajes humanos simbólicos y convencionales): un disparo de rifle, varios disparos, un cuerpo que se derrumba, un coche que se detiene, una mujer que grita, muchas personas que gritan… Todos estos signos no simbólicos dicen que ha sucedido algo: la muerte de un presidente, aquí y ahora, en el presente. Y dicho presente es, repito, el tiempo de las distintas subjetivas como planos-secuencia, filmadas desde distintos ángulos visuales donde el destino puso a los testigos, con sus incompletos órganos naturales o instrumentos técnicos.
El lenguaje de la acción es por lo tanto el lenguaje de los signos no simbólicos del tiempo presente y, sin embargo, en el presente, no tiene sentido, o, si lo tiene, lo tiene subjetivamente, es decir, de forma incompleta, incierta y misteriosa. Kennedy, al morir, se expresó con su acción extrema: la de derrumbarse y morir, sobre el asiento de un negro coche presidencial, entre los débiles brazos de una pequeño-burguesa americana.
Pero este lenguaje extremo de la acción con la que Kennedy se expresó frente a sus distintos espectadores, queda en el presente —en el que es percibido por los sentidos y es filmado, lo cual es lo mismo—, suspendido e inconexo. Como todo momento del lenguaje de la acción, es una búsqueda. ¿Una búsqueda de qué? De una ubicación respecto a sí mismo y al mundo objetivo; y por lo tanto una búsqueda de relaciones con todos los demás lenguajes de la acción con que los demás, sumados a éste, se expresan. En este caso, los últimos sintagmas vivientes de Kennedy buscaban una relación con los sintagmas vivientes de quienes se expresaban es ese momento, viviendo, a su alrededor. Por ejemplo, los de su asesino, o de sus asesinos, que disparaba o disparaban.
Hasta que dichos sintagmas vivientes no hayan sido puestos en relación entre sí, tanto el lenguaje de la última acción de Kennedy como el lenguaje de la acción de los asesinos serán lenguajes truncos e incompletos, de hecho incomprensibles. ¿Entonces qué tiene que suceder para que se vuelvan completos y comprensibles? Que se establezcan las relaciones que cada uno de ellos, casi a tientas y balbuceando, busca. Pero no a través de una simple multiplicación de presentes —como sucedería si yuxtapusiéramos las distintas subjetivas—, sino a través de la coordinación de éstas. Esta coordinación no se limita, en efecto, como la yuxtaposición, a destruir y a anular el concepto de presente (como en la hipotética proyección de las distintas filmaciones, pasadas una tras otra en la salita del FBI), sino que convierte el presente en pasado.
Sólo los hechos sucedidos y acabados pueden ser coordinados entre sí, y adquieren así un sentido (como acaso diré mejor más adelante).
Ahora hagamos una suposición más: que entre los investigadores que vieron las distintas y, por desgracia, hipotéticas filmaciones pegadas una a otra, haya una mente analizadora genial.
Su genialidad no podría consistir sino en la coordinación. Intuyendo la verdad —de un análisis atento de los diversos pedazos… naturalistas, constituidos por las distintas filmaciones—, estarían en condiciones de reconstruirla. ¿Y cómo? Eligiendo los momentos de veras significativos de los distintos planos-secuencia subjetivos, y encontrando, como consecuencia, su real sucesión. Se trataría, en pocas palabras, de un montaje. Después de ese trabajo de elección y de coordinación, los distintos ángulos visuales se disolverían, y la subjetividad, existencial, cedería el paso a la objetividad; ya no estarían las parejas, conmovedoras, de ojos-oídos (o filmadoras-micrófonos) para capturar y reproducir la fugaz y tan poco afable realidad, sino que en su lugar habría un narrador. Este narrador transforma el presente en pasado.
De esto deriva que: el cine (o, mejor dicho, la técnica audiovisual) es esencialmente un infinito plano-secuencia, como lo es, ni más ni menos, la realidad a nuestros ojos y oídos, durante todo el tiempo en que estamos en condiciones de ver y de oír (un infinito plano-secuencia subjetivo que termina con el fin de nuestra vida): y este plano-secuencia, además, no es sino la reproducción (como he repetido varias veces) del lenguaje de la realidad: en otras palabras, es la reproducción del presente.
Pero desde el momento en que interviene el montaje, es decir, cuando se pasa del cine a la película (que son dos cosas muy distintas, como la “lengua” es distinta del “habla”), sucede que el presente se convierte en pasado (se han producido las coordinaciones a través de los varios lenguajes vivientes): un pasado que, por razones inmanentes al medio cinematográfico, y no por una elección estética, tiene siempre las formas del presente (o sea, es un presente histórico).
Entonces aquí tengo que decir qué pienso yo de la muerte (y dejo a los lectores en libertad de preguntarse, escépticos, qué tiene que ver esto con el cine). He dicho varias veces, y siempre mal, lamentablemente, que la realidad tiene su lenguaje —es más, es un lenguaje— que, para ser descrito, necesita de una “semiología general”, de la que aún carecemos, incluso como noción (los semiólogos observan siempre objetos bien diferenciados y definidos, es decir, los varios lenguajes, sígnicos o no, existentes; todavía no descubrieron que la semiología es la ciencia descriptiva de la realidad).
Dicho lenguaje —he dicho, y siempre mal— coincide, en lo que concierne al hombre, con la acción humana. Es decir, el hombre se expresa sobre todo con su acción —no entendida en una mera acepción pragmática—, porque es con esa acción que modifica la realidad e incide en el espíritu. Pero esta acción suya carece de unidad, o sea, de sentido, hasta que no está acabada. Mientras Lenin vivía, el lenguaje de su acción era posible y, por lo tanto, modificable por eventuales acciones futuras. En suma, mientras tiene futuro, es decir una incógnita, un hombre no termina de expresarse. Puede haber un hombre honesto que, a los sesenta años comete un delito: dicha acción modifica todas sus acciones pasadas, y él se presenta entonces como alguien distinto de lo que siempre ha sido. Hasta que yo no esté muerto, nadie podrá dar un sentido a mi acción que, en cuanto momento lingüístico, es difícil de descifrar.
Por lo tanto es absolutamente necesario morir, porque, mientras estamos vivos, carecemos de sentido, y el lenguaje de nuestra vida (con el que nos expresamos, y al que atribuimos la máxima importancia) es intraducible: un caos de posibilidades, una búsqueda de relaciones y de significados sin solución de continuidad. La muerte efectúa un montaje fulmíneo de nuestra vida: o sea, elige sus momentos de veras significativos (ya no modificables por otros posibles momentos contrarios o incoherentes) y los pone en sucesión, convirtiendo nuestro presente, infinito, inestable e incierto, y por lo tanto lingüísticamente no descriptible, en un pasado claro, estable, cierto y que, así, deja describir lingüísticamente (en el ámbito de la citada semiología general). Sólo gracias a la muerte, nuestra vida nos sirve para expresarnos.
El montaje, entonces, hace con el material de la película (constituido por fragmentos, larguísimos o infinitesimales, de tantos planos-secuencia como posibles subjetivas infinitas) lo que la muerte hace con la vida. (1967)
Monday, August 02, 2010
Brasil, Doha, OMC e acordos regionais na visão de Vera Thorstensen
fonte: Valor Econômico > Impresso > Especial pg. A14
Entrevista: Para a professora Vera Thorstensen, país deve firmar tratados com grandes potências para exportar mais
"Brasil precisa fazer mais acordos comerciais"
Assis Moreira, de Genebra
02/08/2010
Vera Thorstensen: "Um dos temas atualmente mais relevantes da política comercial do Brasil é definir qual sua estratégia em relação a China"
A dinâmica atual do comércio internacional não está mais na Organização Mundial do Comércio (OMC) e sim nos acordos regionais. Já há 267 notificados na OMC e 100 estão em negociação, com troca de preferências entre seus membros. O Brasil precisa buscar acordos com as grandes potências e não apenas com países em desenvolvimento. Do contrário, suas exportações serão cada vez mais prejudicadas por regras criadas pelos Estados Unidos, Europa e no futuro pela China em seus entendimentos preferenciais.
Isso é o que defende a professora Vera Thorstensen, que acaba de deixar a assessoria econômica da missão brasileira, em Genebra, para criar um Centro do Comércio Global na Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo. O objetivo é explorar a nova dimensão da regulação do comércio internacional, com a multiplicidade de normas que encarecem os custos para o exportador e podem afetar duramente a competitividade brasileira. Embora a Rodada Doha não prospere, na própria OMC as regras continuam evoluindo através de interpretações de seu Órgão de Apelação.
Doutora pela FGV, Vera Thorstensen, 60 anos, passou 20 na Europa, dos quase 15 em Genebra, depois de "amor à primeira vista" pelos temas de comércio internacional. Publicou o primeiro livro em português sobre OMC e suas regras, em 1999. Montou e teve papel central na formação de 120 jovens advogados que fizeram estágio na missão brasileira em Genebra desde 2003. Deu cursos pelo Brasil inteiro e na Europa (Paris, Lisboa, Barcelona).
Reputada por seu rigor, a professora Vera se tornou uma figura incontornável na delegação brasileira. Por sua sala, ao longo dos anos, passaram autoridades, acadêmicos, técnicos brasileiro, sempre buscando um esclarecimento sobre a OMC e suas regras negociadas na Rodada Uruguai ou em negociação na Rodada Doha.
Na OMC, ela foi presidente do Comitê de Regras de Origem de 2004 a 2010. Um acordo para definir como os países identificam a origem de uma mercadoria para efeito de tarifas continua bloqueado porque os países visivelmente preferem ter margem para burlar as normas.
A seguir, os principais trechos da entrevista que concedeu ao Valor:
Valor:
Por que retornar ao Brasil agora? É frustração com a Rodada Doha?
Vera Thorstensen:
No início deste ano, tomei a decisão de voltar ao Brasil consciente de que eu tinha uma missão a cumprir: criar um centro de estudos sobre a OMC para focar na regulação do comércio internacional. E explico: existe uma percepção no país de que a OMC morreu porque a Rodada Doha continua no impasse. Essa visão está errada. A OMC não só não morreu, como está muito ativa, principalmente na solução de disputas entre os países, onde foi aberto esta semana o 411. E tudo isso tem impactos imediatos no Brasil.
Valor:
Que impactos seriam esses?
Vera:
As regras da OMC não se referem apenas a atividades de exportação e importação de bens e serviços. São muito mais amplas, envolvendo medidas relativas ao comércio com propriedade intelectual, concorrência, investimentos, ambiente, clima, saúde, direitos humanos. Esta é a dimensão da regulação do comércio internacional. Atualmente, são duas as fontes dessa regulação. Uma, são as regras já definidas nos acordos na OMC. E mesmo sem a rodada avançar, essas regras na prática estão sendo ampliadas e revistas por decisões do Órgão de Apelação, que é uma espécie de supremo tribunal dos conflitos do comercio internacional. O mecanismo de solução de controvérsias é composto de duas fases: uma através dos painéis e a outra pelo Órgão de Apelação. Ou seja, não basta hoje apenas ler os acordos da OMC. É preciso ir atrás de todos os painéis relacionados aos temas em conflito e ver como o Órgão de Apelação interpretou os termos dos acordos.
Valor:
Ou seja, um grupo de juízes está fazendo regras, enquanto os governos brigam?
Vera:
Veja, os panelistas e o Órgão de Apelação têm obrigação de solucionar os conflitos comerciais que são a eles apresentados pelos países. E devem fazer isso com base nos acordos existentes que tem 700 páginas e outras 10 mil páginas de listas de compromisso de liberalização dos países. Como a OMC toma decisão por consenso, a linguagem de suas regras é muito pouco clara, é a famosa ambiguidade construtiva para se fechar negociações. Então, um país interpreta uma regra de um jeito e o outro o contrário. E isso é resolvido pelo Órgão de Solução de Controvérsias. Para manter a previsibilidade do sistema, os membros da OMC esperam que a próxima decisão utilize a interpretação anterior. É o peso da jurisprudência que tem papel fundamental. De fato, discute-se no mundo acadêmico a que ponto o ativismo do Órgão de Apelação está assumindo a posição dos negociadores dos países. E com o impasse da Rodada Doha, são esses juízes que estão atualizando na prática as regras da OMC.
Valor:
Por exemplo?
Vera:
O artigo 20 do Gatt, de 1947, sobre as exceções gerais, isto é, quando um país pode deixar de cumprir as regras da OMC, está sendo usado para dirimir conflitos que envolvem comércio e ambiente. Foi o caso dos pneus entre o Brasil e a União Europeia, do atum entre México e EUA, dos camarões entre EUA e vários países da Ásia, dos arbestos entre Canadá e UE. O Órgão de Apelação pegou uma página de um acordo negociado há 63 anos e através desses conflitos foi criando passo a passo uma regulação para disputas envolvendo ambiente, algo que os países até hoje nunca chegaram a um acordo.
Valor:
Qual a segunda fonte hoje de regulação do comércio?
Vera:
São os acordos regionais de comércio, negociados entre dois ou grupos não necessariamente próximos, como entre Chile e China. A regra que continua a vigorar em termos de acordos regionais é apenas o artigo 24 do velho Gatt, que tem 63 anos. E hoje está acontecendo uma explosão de acordos regionais incentivada até pelo impasse da Rodada Doha. Estão notificados na OMC 267 acordos regionais e a entidade já tem informação de que outros cem acordos estão em negociação.
Valor:
Qual o problema de ter tantos acordos regionais?
Vera:
O problema é que esses acordos estão usando as regras que englobam não só temas regulados da OMC, como estão expandindo e incluindo nova regulação como propriedade intelectual (Trips) e investimentos (Trims) no comércio. Além disso, os acordos regionais estão criando regras sobre temas que a OMC nunca conseguiu regular, como padrões trabalhistas, ambiente, investimento e concorrência. Há acordo de comércio regional que exige que os países tenham assinado as sete convenções fundamentais da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Na OMC, os países em desenvolvimento afirmam que esse tema não é comércio e deve ficar na OIT. Só que, por conta da concorrência de países que não tem padrões trabalhistas, esse tema voltou a ter grande interesse. O fato de o país não ter esses padrões causaria uma redução significativa dos custos de exportação, como no caso da China, afetando a competitividade dos países que seguem as convenções da OIT.
Valor:
E qual o problema de os acordos regionais criarem regras novas?
Vera:
O problema é que a multiplicidade dessas regras pode minar a OMC e a longo prazo até destruí-la. Por quê? A existência de muitas regras sem controle e sem um órgão de supervisão está levando a criação de grandes blocos de regulação. Tem o modelo dos EUA, da UE e no futuro talvez da China. E já está ocasionando conflitos de regras, aumentando o custo de exportação e reduzindo a competitividade dos países que estão fora desses blocos.
Valor:
Qual o impacto para o Brasil?
Vera:
O Brasil não tem tradição de negociar acordos regionais fora da América do Sul e terá cada vez mais dificuldades para exportar para os grandes blocos que usam as regras que eles próprios criam, como regras sanitárias e fitossanitárias, barreiras técnicas, padrões privados de alimentos e regras de origem preferenciais. São as novas barreiras ao comércio. Dentro desses blocos, a OMC não tem controle.
Valor:
Como exportador agrícola, o Brasil ficará mais vulnerável?
Vera:
Sem dúvida.
Se os EUA e a UE criam regras sobre alimentos, atingindo todos seus acordos preferenciais dentro de seus blocos, isso configura uma segmentação das novas regras de proteção no comércio internacional. Se o Brasil não participa, as exportações brasileiras são prejudicadas. O Brasil tem que enfrentar um grande dilema: fazer acordos regionais ou ficar autônomo. O problema é que, como grande produtor agrícola, é muito difícil fazer acordo preferencial com outros países, porque o setor agrícola é sensível para a grande maioria dos países.
Valor:
O país deveria buscar acordos com os grandes parceiros?
Vera:
A dinâmica atual do comércio internacional não está mais na OMC e sim nos acordos regionais. Ficar fora dos grandes blocos poderá afetar sem dúvida as atividades internacionais das empresas brasileiras.
Valor:
Mas o Brasil negocia com a UE, Índia, África do Sul e outros.
Vera:
Se a dinâmica é fazer acordos regionais, o Brasil deveria estar negociando não só no eixo Sul-Sul, mas no eixo Norte-Sul.
Valor:
Qual a consequência do conflito entre OMC e acordos regionais?
Vera:
Se as regras da OMC não forem atualizadas, crescerá o problema na hierarquia de regras, com impacto no mundo de negócios. Para se ter uma ideia, o comércio internacional envolve US$ 12 trilhões por ano. Com a multiplicação desses conflitos, os países serão obrigados a sentar de novo na mesa não só para concluir a Rodada Doha, como partir para a negociação de regras mais ambiciosas para novos temas do comércio global.
Valor:
Quando Doha será concluída?
Vera:
Os prazos para as conclusões das rodadas são cada vez mais longos, porque elas são mais complexas. Não me causa nenhuma estranheza que Doha não tenha sido concluída. Mas o custo político de não concluí-la é muito alto, daí porque acredito que ela será bem sucedida. A rodada será concluída quando as lideranças tiverem consciência do perigo que a multiplicação dos acordos regionais representa para o sistema multilateral que levou 60 anos para ser construído. Quando a incompatibilidade das regras regionais começarem a afetar os grandes países, eles voltarão a se sentar na mesa de negociação na OMC.
Valor:
A China é um risco ou oportunidade para o Brasil?
Vera:
A China pode representar oportunidade pelo tamanho de seu mercado e um risco pela sua competitividade com produtos brasileiros tanto no mercado interno com em terceiros mercados. Um dos temas mais relevantes hoje de política comercial do Brasil é definir qual sua estratégia em relação a China. Os brasileiros devem produzir na China ou o Brasil deve atrair a China a produzir no Brasil? Até agora, o Brasil não tem estratégia clara, apesar do aumento das relações bilaterais. A existência das regras da OMC é fundamental nesse relacionamento. O Brasil deve usar todos os instrumentos que a entidade permite para defender sua indústria e utilizar as mesmas regras para abrir o mercado chinês.
Valor:
Qual será o foco do Centro do Comércio Global que a sra. está criando?
Vera:
O objetivo é analisar o quadro regulatório do comércio internacional explorando sua nova dimensão, pois as regras não envolvem só exportação e importação, mas toda uma gama de temas que vão de concorrência a saúde, investimentos, ambiente, clima, direitos humanos . E isso é essencial para a economia brasileira. Precisamos conhecer bem os detalhes das regras e saber usá-las para defender os interesses do Brasil. A ideia é juntar advogados, economistas e administradores de empresas para estudar e avaliar os impactos dessas regras, tanto da OMC como de acordos regionais, para a economia brasileira, a competitividade e sobrevivência das empresas. O centro pretende acompanhar a regulação especifica dos principais parceiros do Brasil, como União Europeia, Estados Unidos, China, Índia, África do Sul.
Valor:
No que o centro inovará?
Vera:
Minha intenção é criar uma nova geração de especialistas em comércio internacional. Ao invés de só pensar em participar de painéis (disputas) na OMC, que saibam identificar os problemas concretos das empresas, as regras que foram desrespeitadas e levar os casos para os comitês específicos da OMC. É uma área ainda não explorada no Brasil. Poucos percebem que as regras da OMC estão internalizadas nas regras brasileiras e que isso pode ser utilizado nas atividades normais das empresas e entre empresas e governos. Esse trabalho, de dirimir conflitos, é não só de advogados, mas de economistas, porque cada vez mais os conceitos econômicos estão entrando na OMC.
Valor:
As escolas de economia e direito estão atualizadas no Brasil?
Vera:
Não. É triste constatar que mesmo as melhores escolas de economia e direito dão pouca atenção ao quadro regulatório do comércio internacional. Existe mesmo o absurdo de alguns professores considerarem que as regras da OMC não fazem parte do direito internacional. Na verdade, o que acontece na OMC faz parte de uma nova área do direito e da economia, que é chamada de "international trade law and economics", que já tem até uma associação criada em Genebra. Em seu congresso, em Barcelona, foi triste constar que, entre 350 participantes, só cinco eram brasileiros. São raras as escolas que oferecem cursos sobre OMC e disputas de conflitos. Como se pode criar economistas e advogados sem saber o quadro regulatório do comércio internacional, como esses futuros profissionais vão defender os interesses das empresas?
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